quinta-feira, 7 de abril de 2011

Meditações diante do bumbum de Juliana

ULTIMAMENTE SÓ HOUVE um assunto nesse bendito país: o bumbum de
Juliana Paes na Playboy .O bumbum era esperado como um messias redentor, aguardado
como a salvação do Brasil neste momento sem graça.
Políticos, bancários, eu, todos ansiávamos por esse bumbum como por um Maomé,
um profeta. O que poderia nos revelar esse bumbum ?
Corri para as bancas e comprei a Playboy sob o olhar debochado do jornaleiro que
me reconheceu e perguntou se eu não ia levar o The Economist também. "Claro, claro...",
respondi, vermelho. Chego em casa, rasgo a capa de plástico com as mãos trêmulas, abro
com uma sensação de pecado e esperança, e vejo Juliana Paes em seu esplendor. Folheio
a revista e caio numa perplexidade muda.
Antes de continuar, devo dizer que já escrevi sobre o bumbum da Feiticeira, o
bumbum da Tiazinha e continuo sem uma palavra apropriada. Não há na língua
portuguesa um termo corrente para essa parte do corpo. A palavra "bunda" tem uma
conotação pejorativa, um substantivo já adjetivado de saída. Há eufemismos como
"traseiro" ou metonímias como "nádegas", "glúteos" etc... Portanto, "bunda" é a palavra
certa...
Muito bem; com todo o respeito, a bunda de Juliana me deixou aparvalhado. Não
sei se esperava muito; só sei que fui tomado por uma funda decepção. Não sobre a beleza
da bunda, pois é muito bonita, sim, mas pelo choque de realidade que me trouxe. Afinal,
verificamos que era apenas uma bunda e não um enviado de Deus, era apenas uma moça
que nos parece gentil, romântica, bondosa como uma babá, mostrando o bumbum como
um bebê recém-nascido.
Ela sorri, parecendo dizer: "É só isso o que vocês queriam? Ora... pois aqui está
minha bundinha..." Olhei o bumbum de Juliana por todos os ângulos, e nada aconteceu,
sexual e filosoficamente. Confesso, Juliana, com todo o respeito, que imaginei cenas
eróticas comigo mesmo, com outros e nada senti... Pensei: "Estou decadente, ou as uvas
estão verdes..." Mas, não, não era isso. Bateu-me mesmo uma certa tristeza, de ver aquela
moça ali, satisfazendo nosso desejo bruto e invasivo, esse povo de onanistas e sodomitas
sempre desejando a mulher por trás. Senti um vazio ao ver um segredo revelado,
estragando com sua nudez meridiana a glória da moça da novela. Algo como água fria
num sucesso, algo como a traição contra Zeca Pagodinho, no auge de sua ascensão. O
mercado estraga o prazer, programando-o. Toda a beleza do mito é justamente seu
mistério inacessível, seu enigma não decifrado. Juliana da novela não é só sua bunda.
Ela é a doce ingênua do subúrbio, a moça generosa, dadeira, mas honesta, com seu
rosto redondo de brasileira, com largos quadris de boa mãe leiteira.
Sua nudez não tem a norma perversa das playmates típicas. Falta-lhe a crua
perversão das outras, gatas ferozes prometendo sexo selvagem. Não. Juliana tenta rostos
sacanas, mas só passa uma doçura incontrolável, faltando-lhe a catadura zangada das
punks ou sadomasoquistas.
Daí, me bateu a verdade inapelável e cruel: a bunda não existe. Só existe a "idéia"
de bunda, o conceito platônico de bunda. Isso. No caso de Juliana, o bumbum real destrói
o bumbum imaginário. Sempre sonhamos com aquele bumbum adivinhado sob os
vestidos na novela e ele tinha a multi-dimensão rica de uma metáfora. Ele era todos os
bumbuns, ele era uma promessa de vida em nossos corações. Mas, diante do bumbum
real, a vida perdeu o mistério, tudo se aquietou na paz da anatomia óbvia. Vemos, com
clareza e realismo, que é apenas um bom bumbum brasileiro, que um dia cairá, como o
PT.
Por isso, me pergunto por que a bunda é nosso símbolo? Para os anglo-saxões são
os seios, leiteiros, alimentícios. O bumbum para nós, ibéricos, é menos inquietante que a
vagina; essa nos lembra fecundidade, essa nos coloca diante da responsabilidade da
criação da vida, e até dos perigos da devo ração pela fêmea dentada e potente. A vagina é
um pênis embutido; a vagina é o "ouro" e merece respeito. Já o bumbum, por infecundo, a
reboque do corpo, tem uma imagem mais propícia para sacanagens sem perigo, além de
ser uma herança do homossexualismo deslocado dos senhores portugueses diante da
negras zulus nas senzalas.
Por isso, afirmo que o bumbum de Juliana é uma bunda romântica, familiar. No
caso de Tiazinha ou da Feiticeira, a bunda tinha vida própria. Era mais importante que as
donas.
Muitas mulheres de bonitas bundas chegam a ter ciúmes de si mesmas e têm uma
atitude envergonhada de suas formas calipígias. A mulher de bunda bonita caminha como
se fossem duas: ela e sua bunda. Uma fala e ninguém ouve; a outra cala e todos olham. A
mulher de bunda bonita não tem sossego; está sempre auto-consciente do tesouro que
reboca. A mulher de bunda bonita mesmo de frente está sempre de costas. A mulher de
bunda bonita vive angustiada: quem é amada ? Ela ou sua bunda ? Algumas bundas até
parecem ter pena de suas donas e quase dizem: "Olhem para ela também, ouçam suas
opiniões, sentimentos... Ela também é legal...”.
A bunda hoje no Brasil é um ativo. Centenas, milhares de moças bonitas usam-na
como um emprego informal, um instrumento de ascensão social. A globalização da
economia está nos deixando sem calças. Sobrou-nos a bunda... nosso único capital.

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